Muitos pesquisadores apontam que vivemos uma epidemia de déficit de atenção, assim como de outros transtornos mentais – e, muitas vezes, medicados com muitos fármacos. Como pensar a saúde mental em nosso tempo a partir de outras perspectivas?

Pensando primeiro que toda saúde mental é precária e que aspirar a uma saúde mental que seja definidora pressupõe uma fortificação do sujeito (à base de comprimidos e diferentes formas de anestesia) que pode revelar-se fatal. O reprimido regressa de forma ainda mais temerosa e a morte se instala no coração de quem quer viver sem nenhum sobressalto. Nossas “feridas” nos fazem sofrer, sem dúvida, mas ao mesmo tempo são uma fonte de energia, de transformação que trata de interrogar e elaborar. Não se trata de proteger-se deixando o que desestabiliza de fora, o que nos leva à procura de todo o tipo de bodes expiatórios, mas de aprender a saber-fazer com a nossa própria loucura – porque todos somos mais ou menos loucos, o que é sabido desde Freud.

Amador Fernández-Savater, ativista e pesquisador espanhol

fonte: https://outraspalavras.net/crise-civilizatoria/para-encarar-eclipse-da-atencao-e-do-desejo/

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Este é um trecho de uma excelente entrevista feita com Amador Fernández-Savater“ um ativista e pesquisador espanhol; ou um filósofo pirata, como gosta de se definir”.

Ele traz um olhar interessante com relação a atenção não só como uma questão pessoal, mas política. Aponta para uma diferenciação importante, nem sempre considerada, entre atenção e concentração, a atenção é um estado de abertura e disponibilidade, portanto, ligada ao desejo. “Se há desejo há atenção, prestamos atenção ao que desejamos.”

Fala também da maneira de lidar com o sofrimento a partir de medicação e como isso pressupõe uma “fortificação do sujeito”, como se o psiquismo humano fosse hermético e tivesse um funcionamento idealmente sem problemas.

Manter o eu forte é o objetivo da psicologia do eu e foi justamente essa a crítica de Lacan sobre a leitura equivocada da psicanálise que desconsidera que somos seres de linguagem atravessados pelo inconsciente. O que a psicanálise nos revela é que quando o inconsciente é negado ele retorna, insiste em forma de angústia e os mais diversos sintomas.

Uma visão lúcida do sofrimento humano em nossos dias atuais.